domingo, 1 de maio de 2016

Cirurgia de transgenitalização.



Fiquei sabendo, num artigo de Lucimeire Santos, que o Projeto Transexualismo, desenvolvido pela Faculdade de Medicina e Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (UFG) é hoje uma das referências do País, tanto no que diz respeito ao tratamento psicológico, bem como nos processos em que é necessária intervenção cirúrgica, chamada de cirurgia de redesignação sexual (CRS).

"Idealizado em 1997, a partir de uma demanda espontânea de pacientes que buscavam o HC, o projeto ganhou o aval da direção do hospital, que organizou uma equipe composta de ginecologistas, urologista, endocrinologista, geneticista e cirurgião plástico para coordená-lo. Em 1999 já estava em funcionamento, com a primeira cirurgia tendo sido realizada em 2001. Desde então, foram feitas 16 intervenções de transgenitalização para os casos MtF ("male to female", ou seja, de masculino para feminino) e outras oito cirurgias FtM ("female to male" - de feminino para masculino).

Mariluza Silveira explica que, embora haja uma demanda de outros Estados, como Distrito Federal e Tocantins, e até de outros países - o HC já atendeu paciente da Venezuela -, o projeto consegue dar assistência a todos os interessados. Mas o processo é longo. Do inicío do tratamento à cirurgia de redesignação, são transcorridos aproximadamente três anos. Tempo em que o paciente passa pelo processo de tratamento com hormônio e, conforme estabelece a legislação brasileira, por dois anos de psicoterapia, momento em que é assistido por psicólogos e psiquiatras.

O acompanhamento é necessário para evitar dúvidas freqüentes até mesmo entre os pacientes, que, por vezes, buscam o tratamento, mas não se enquadram no perfil de transexual, casos de travestis e homossexuais. O transexualismo refere-se a pessoas cuja identidade de gênero (homem ou mulher) não corresponde ao sexo anatômico. Em outras palavras, explica a professora, é quando existe discordância entre o sexo cerebral e o anatômico'. Em suas entrevistas, Mariluza faz questão de frisar as diferenças para que não haja preconceito e confusão por parte da sociedade. No travestismo, por exemplo, o indivíduo não crê que haja uma troca de identidade de gênero, mas usa roupas do sexo oposto porque sente prazer erótico no ato. Na maioria destes casos, são homens que não desejam passar por um processo cirúrgico para retirada do pênis.  Do mesmo modo, os homossexuais também ficam fora das cirurgias de redesignação sexual porque não têm dúvidas e sofrimentos quanto ao sexo anatômico, embora se relacionem com pessoas do mesmo sexo. A professora explica que o tratamento envolve o uso de hormônios antes e após o processo cirúrgico. Para fazer parte do projeto, a pessoa precisa ter mais de 18 anos. Caso todo o processo seja concluído, o paciente será orientado a procurar assistência judiciária para promover a mudança de nome e sexo na documentação pessoal. Mariluza conta que, em Goiás, normalmente só se consegue a alteração após a realização da cirurgia, embora já tenha atendido uma paciente que conseguiu concretizar a mudança antes da intervenção. No caso de aprovação, vai depender da decisão do juiz se a designação do gênero no documento de identidade receberá um acréscimo, com a inscrição 'sexo cirúrgico'. 'Na verdade, isso não é bom, porque pode reforçar o preconceito. O paciente quer se integrar, ser igual. Se for uma moça, ela quer casar de véu e grinalda, como sonha quase todas', argumenta a professora."

No caso da cirurgia FtM


"O processo cirúrgico é mais complexo e oneroso. Por isso, a UFG não realiza a chamada faloplastia (técnica de reconstrução do pênis, através do uso de pele, geralmente transplantado da barriga, coxa ou antebraço). Nesses casos, a pele se junta a veias e nervos, que envolvem uma prótese peniana, aproveitando a estrutura do clitóris. Essas adequações farão com que o pênis fique sensível a estímulos sexuais. Entretanto, a ereção só ocorre quando a prótese é acionada. Segundo Mariluza, a referência em faloplastia no mundo é a cidade de Ghent, na Bélgica. Os custos do processo, contudo, giram em torno de 51 mil euros. Na UFG, opta-se pela realização da Metoidoplastia (ou genetoplastia). O processo consiste na liberação do clitóris, aumentado por hormônios,  com a inserção de bolas protéticas de silicone entre os grandes lábios, para a constituição de algo similar ao saco escrotal. Neste caso, o clitóris vai tomando a forma de um pequeno pênis, e responde a estímulos sexuais, sem que haja a necessidade de prótese.

Pioneirismo

O primeiro caso de cirurgia de transgenitalização no Brasil ocorreu em 1971, com a operação de Waldir Nogueira, feita pelo médico Roberto Farina. O cirurgião acabou respondendo a processo criminal no Conselho Federal de Medicina por lesões corporais. O caso que mais ganhou destaque na mídia, porém, foi o da modelo Roberta Close - transexual MtF. Roberta realizou sua cirurgia na Suíça na década de 80, iniciando um longo processo de luta na Justiça para mudança de nome e sexo nos documentos. Ela só conseguiu a alteração em 2005, tendo sofrido, segundo a professora, uma perseguição da Justiça pelo fato de ser artista e ter dado publicidade ao tema.

Só em 1997, o CFM 'liberou eticamente' os médicos para realizarem cirurgias de transgenitalização no País, por meio da resolução 1.482/97, estabelecendo que seja realizada em hospitais públicos e universitários, como forma de pesquisa.

A resolução também detalha os procedimentos que devem ser observados, tais como a exigência da psicoterapia e acompanhamento por uma equipe multiprofissional."

O Projeto Transexualismo da Faculdade de Medicina e Hospital das Clínicas da UFG, destinado a oferecer acompanhamento psicológico a pessoas portadoras de Distúrbio de Identidade de Gênero (DIG) e, quando for o caso, realizar a Cirurgia de Redesignação Sexual (CRS), tem se constituído como serviço de referência regional e nacional na rede pública de saúde, absorvendo a demanda, além de Goiás, do Distrito Federal e do Tocantins, atendendo ainda pacientes do Paraná e até de outros países, como é o caso de Venezuela. Começou a funcionar efetivamente em 1999 - o projeto já realizou, no mínimo, 22 cirurgias MtF e 7 FtM.

De acordo com a coordenadora do projeto, professora Mariluza Terra Silveira, do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina, existe atualmente uma fila de espera de pacientes candidatos à CRS, motivada não necessariamente pela alta demanda e sim pela exigência de pelo menos dois anos de psicoterapia, quando são submetidos a severo acompanhamento da equipe de psicólogo e psiquiatras, para depois serem assistidos por equipe multiprofissional com médicos ginecologistas, urologista, endocrinologista, geneticista e cirurgião plástico.

Nenhum comentário:

Postar um comentário